terça-feira, 23 de agosto de 2011

Na natureza selvagem (Into the wild - 2007)


Quando se escreve uma biografia, é comum que se tome uma dessas duas direções: ou a apologista ou a crítica. Na apologista, cria-se um herói. Na crítica, desconstrói-se um ídolo ou expõe-se seus defeitos. Em Na natureza selvagem, o livro e o filme parecem ter tomado rumos distintos.

No filme, vemos uma obra claramente apologista. Christopher McCandless é um herói que, cansado das hipocrisias da sociedade, decide viver uma experiência solitária, criando para si mesmo um desafio de sobrevivência, que o aproximaria de sua real natureza. Tenho certeza de que os elogios recebidos pela película foram merecidos. Mas há que se ressaltar que ela apenas aborda um lado do protagonista e ignora muitas reflexões interessantes trazidas pelo livro.

 proposta da versão escrita parece ser diferente mesmo. Jon Krakauer não está preocupado em criar um herói, mas em dialogar com a história do rapaz que fez uma viagem sem volta ao Alasca. O Christopher McCandless que conhecemos tem muitas qualidades como algumas que vemos no filme. Todavia, também muitos defeitos, como um lado místico obscuro, uma certa arrogância, hábitos esquisitos, uma personalidade difícil, entre outros. O autor do livro compara a história de McCandeless com a de outros que fizeram coisas parecidas (sim, tentar passar algum tempo vivendo isolado no Alasca e não conseguir é praxe). O ponto crucial é, a meu ver, a comparação com a própria história – Krakauer fez algo semelhante e sobreviveu.

Apesar deste texto ser uma crítica ao filme, vou destacar um tema que foi negligenciado no cinema: a tentativa de compreensão das razões de McCandless. O que levou o garoto a tal ousadia?  Krakauer, como já mencionei, teve seu momento McCandless, mas com a sorte de sobreviver. Ele escalou sozinho certa montanha e fazendo isso quase morreu. Após retornar, foi a um bar numa cidade próxima e contou sua façanha. A reação foi surpreendente: as pessoas não duvidaram dele, mas simplesmente não deram importância. Ele frustrou-se, confessa, pois esperava, inconscientemente, ser considerado especial, importante, pela proeza. Mas o que era importante para ele, o que era uma prova para ele, não era para os outros. Kraukauer se pergunta: terá tido McCandless motivação semelhante? O autor do livro quer refutar a ideia de que o jovem aventureiro era um suicida, como pensavam muitos no Alasca (“mais um idiota que veio morrer aqui”).

Compreender aos outros é uma tarefa muito difícil. Mal compreendemos a nós mesmos. Mas o diálogo é possível. Sabemos que, no fim das contas, McCandeless nunca deixou de pensar na sociedade da qual se isolou. Ele escreveu seu bordão famoso “a verdadeira felicidade é a compartilhada” talvez se surpreendendo com sua solidão, e antes de morrer tentou nos convencer de que foi uma pessoa feliz. Ele poderia ter sobrevivido se tivesse levado um mapa do local, mas preferiu desenhar um próprio – erro que o levou a pensar que estava preso, quando na verdade havia uma saída fácil. Se tivesse sobrevivido, McCandless seria hoje Kraukauer?

Vale a pena ver o filme. Contudo, para uma visão mais ponderada, o livro deve ser lido também.

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