quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Intruders (1992)


Tirem as crianças da sala

O gênero de ficção científica que trata de relações com extraterrestres está um pouco desgastado. Bem a grosso modo, eu diria que geralmente nesses filmes os et’s ocupam apenas duas posições: ou vilões ou "mocinhos". Quando vilões, o que é mais frequente, pretendem invadir a Terra e exterminar ou escravizar os seres humanos (ex: Guerra dos Mundos, Independence Day, Alien, Predador, etc.) e quando mocinhos, trazem algum conhecimento científico ou espiritual que permite o progresso da humanidade (K-Pax, Contato, Contatos imediatos de terceiro grau, Alien Visitor, etc). Há muitas exceções, é claro, mas em regra eles ocupam essas posições morais enfadonhas.

Intruders é um pouco diferente. Trata-se de uma reconstituição de algumas histórias de abduções alienígenas na visão de pessoas que juram de pés juntos que foram abduzidas. No filme, duas mulheres vivem suas vidas comuns até que são atormentadas por algumas lembranças estranhas, que vão aparecendo de forma fragmentada. Elas se submetem a uma regressão, feita por um psicólogo, e nessa altura as lembranças vão aparecendo de forma clara. Acreditar nos relatos vai da boa vontade do expectador. Vamos observar alguns pontos interessantes do filme.

Em primeiro lugar, como eu já disse, trata-se de um ponto de vista das “vítimas” (ou das que se acreditam vítimas). A história aborda problemas específicos como o “preconceito” que elas sofrem, primeiro acreditando-se loucas e depois com medo de serem ridicularizadas por outras pessoas, e também a vulnerabilidade sentida, bem como a incompreensão das próprias modificações do corpo, que resultam da intervenção dos “intrusos”.

Em segundo lugar, e o ponto que acho mais interessante no filme: os extraterrestres não são pintados como figuras morais, mas como um ponto de desconhecimento, de incompreensão. Eles não são exatamente gentis nem exatamente agressivos. São colocados nestas posições, entretanto, pelas variadas vítimas, que os interpretam pelo próprio ponto de vista. Nesse aspecto há um esboço de uma tentativa de diálogo - não correspondida - acerca do que é o “ser humano”. Os humanos perguntam “o que são vocês?”, mas a pergunta soa como “o que somos nós?”.  A reposta que o filme dá parte dos próprios perguntadores: os alienígenas estranham os afetos e as emoções humanas. Tudo isso é muito sútil, não está explícito no filme.

Acredito que o ponto mais frutífero nas histórias de contatos com outros mundos é o diálogo que permite nosso  autoconhecimento. Todavia, é bom ressaltar que isso nunca aconteceu na vida real e, por consequência, todas as representações de alienígenas feitas no cinema e na literatura são humanas, demasiado humanas (vilões ou mocinhos, a moral é sempre a nossa). Por essa razão, penso que Intruders faz muito bem em retratá-los como um desconhecido. 

Por outro lado, é possível também se fazer uma analogia com a história humana, já que o “descobrimento” (“encobrimento” diria Dussel) da América pelos europeus foi um momento em que dois universos culturais completamente distintos se encontraram. O que ocorreu não foi, ao que parece, exatamente um diálogo, pois uma das culturas (a dos ameríndios) foi subjugada e quase completamente destruída. Talvez essa história justifique  - alguém disse isso certa vez, não me recordo quem - o medo do contato com vida inteligente fora da Terra, pois para os ameríndios, o contato com os europeus foi um péssimo negócio.

Voltando ao filme: Intruders não deve ser visto por crianças, pois há algumas cenas que podem ser um pouco traumatizantes. Os pesadelos do monstro que invade o quarto durante a noite se realizam – (a criança grita e a mãe não pode fazer nada). 

Há também pontos negativos no filme. A história se desenrola de forma um pouco demorada e os efeitos especiais não são dos melhores, embora sejam satisfatórios. E adivinhe qual é a língua falada pelos alienígenas?

Apesar desses pequenos detalhes, o filme é muito bom. Recomendo.

3 comentários:

  1. Gosto do tema e estava procurando um filme que abordasse de um ponto de vista diferente. Boa indicação!

    O cientista que disse para termos cuidado ao querer fazer contato é o Stephen Hawking: http://www.timesonline.co.uk/tol/news/science/space/article7107207.ece

    O Marcelo Gleiser também fala um pouco sobre isso: http://www.ets-e-ovnis.com/2011/06/marcelo-gleiser-e-sua-visao-sobre-vida.html

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  2. Nem precisa ir tão longe, na descoberta da América: nós fazemos esse tipo de invasão diariamente com os outros animais: capturamos, usamos e descartamos, "Sem pedir permissão", usando uma fala de um dos personagens. A causa é nobre apenas do nosso ponto de vista, mas se os aliens nos usassem para curar as doenças deles, alimentá-los, criar produtos para eles, inevitavelmente os consideraríamos covardes e vilões. Em resumo, mesmo que tudo isso seja verdade, não temos lá muita moral para reclamar.

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